Visualidades contemporâneas

Por Alice Fátima Martins (UFG/FAPEG/CNPq – Brasil)

Neste projeto de pesquisa, com base nos Estudos Visuais, são discutidas algumas questões relativas às imagens que são produzidas e circulam em diversos cenários da cultura contemporânea. Sua ênfase está, sobretudo, nos circuitos mais populares, entre práticas artesanais e articulações com imagens técnicas, nos fluxos de imagens entre os diversos públicos, nos ambientes escolares, salas de projeção, mídias em geral, e nos processos educativos, em ambientes diversos, que atuam na formação dos sujeitos contemporâneos para interagir e se apropriar das dinâmicas dessas visualidades – ou refutá-las.

Para tanto, o projeto integra três subprojetos, abrindo-se à possibilidade de articular redes de investigação e discussão. A partir desses subprojetos, a trama de discussões se desenvolve de modo rizomático: a) Visualidades contemporâneas em contextos de educação formal e não-formal, b) Outros fazedores de cinema, e c) Práticas artesanais e experiências estéticas contemporâneas.

Subprojeto 1: Visualidades contemporâneas em contextos de educação formal e não-formal

Entre os anos 2005 e 2012, desenvolvi o projeto de pesquisa intitulado Artes Visuais em contextos de educação formal e não-formal. Nesse período, tive a oportunidade de acompanhar várias escolas da educação básica, conversar com professores, estudantes, membros da comunidade, orientar estudantes de graduação e pós-graduação em projetos de conclusão de curso, iniciação científica, e mestrado (dissertações e teses disponíveis em: http://www.culturavisual.fav.ufg.br/p/6212-dissertacoes); foi possível, também, manter contatos sistemáticos com iniciativas do circuito artístico-cultural, tais como centros culturais, museus, associações, onde são desenvolvidas atividades de formação junto à comunidade; finalmente, algumas incursões foram realizadas em ambientes da rede mundial de computadores, no tocante aos seus potenciais tanto para a educação formal, quanto para ações de educação não-formal, e na formação e suporte a educadores. Os trabalhos desenvolvidos a partir desse projeto levaram a uma ampliação de alguns conceitos e à problematização de outros. Nesse período foi formada uma base de dados que têm fornecido os referenciais para o desenvolvimento de reflexões sobre as relações entre imagens da arte, visualidades contemporâneas e projetos educativos dentro e fora das instituições escolares. Ou seja, nesta etapa da pesquisa, serão trazidas à pauta de estudo alguns tópicos que emergiram no trabalho de campo da etapa anterior. Dentre as quais, os modos como a arte e suas imagens têm sido inseridas nos contextos de aprendizagem, na educação formal e não-formal, e seus desdobramentos. Serão feitas perguntas a respeito de como os projetos educativos preveem essas relações, as dificuldades e encaminhamentos que têm sido dados por educadores, as implicações conceituais de escolhas feitas nas práticas educativas. Do mesmo modo, o papel educativo cumprido pelos chamados aparelhos culturais será trazido à pauta das reflexões: museus, centros culturais, espaços expositivos, salas de cinema, entre outros.

Subprojeto 2: Outros fazedores de cinema

Em 2009 e 2010, desenvolvi o projeto de pesquisa intitulado Catadores de sucata da indústria cultural, no Programa de Pós-Doutorado em Estudos Culturais do Programa Avançado de Cultura Contemporânea da UFRJ. O recorte proposto envolvia o estudo da produção filmográfica de três cineastas que atuam fora das redes comerciais e também dos circuitos dos festivais e mostras, oficiais ou alternativos. Um exibidor de filmes, na periferia de São Paulo, fechou o grupo pesquisado, e também motivou o título da pesquisa, por se tratar de um catador de sucata que, no exercício de seu trabalho, construiu uma sala de cinema para projetar filmes à comunidade pobre de sua região, sem acesso às salas de cinema comerciais.

A partir de então, o recorte da pesquisa foi estendido para a produção de fazedores de cinema com perfil semelhante, que atuam no Estado de Goiás. Em 2011, mapeei a produção de Martins Muniz (Goiânia), e de Hugo Caiapônia (Caiapônia). Acompanhei, também, a programação de três mostras, tendo realizado a curadoria da terceira: Mostra de Cinema Martins Muniz (Cine Ouro/Goiânia/GO), Mostra de Cinema Hugo Caiapônia (Cine Ouro/Goiânia/GO), Mostra Outros Fazedores de Cinema (Cine UFG/Goiânia/GO).

O subprojeto de pesquisa Outros fazedores de cinema tem em foco a análise de filmes produzidos por realizadores de cinema que produzem seus trabalhos de modo alternativo, com autonomia em relação aos circuitos comerciais, à crítica especializada, e aos festivais. Para tanto, faz uso de baixos orçamentos, e estabelece relações de diálogo com segmentos muito específicos de público.

Filmes disponíveis online:
Diabo Velho – O Anhanguera – Roteiro e Direção: Martins Muniz

Imbilino: O galo e a mega da virada. (trecho do filme) – Direção: Aroldo Filho Roteiro, produção e atuação: Hugo Caiapônia.

Subprojeto 3: Práticas artesanais e experiências estéticas contemporâneas

Nas escolas, nos centros culturais e de arte, ensinam-se categorias da cultura, às quais é atribuído caráter universal e atemporal. Por cultura, aqui, entendam-se não só os conjuntos de práticas sociais, os elementos constituidores dos imaginários coletivos, os referenciais materiais e imateriais de organização dos grupos humanos em dados contextos sócio-históricos e geográficos, mas também dentro dessas comunidades, as diferentes redes de pertencimento que se constituem, muitas sobrepostas, quantas contínuas, outras tantas conflitantes entre si.

Uma dessas categorias da cultura, que se pretendem universais, sem sê-lo, é a noção de arte. Embora não haja consenso quanto à sua definição, prevalece um sentido difuso de que a certas produções em determinadas circunstâncias, legitimadas por certos procedimentos e rituais, veiculadas em certos lugares ou meios, sobretudo quando realizadas e assinadas por certas pessoas, pode ser atribuída a alcunha de arte.

Constituindo outros campos expressivos, encontram-se práticas identificadas como pertencentes às culturas populares, às quais se atribui valor menor, do ponto de vista estético. Além das manifestações populares, outras produções aumentaram as listas dos itens que integram essa que se passou a considerar baixa cultura, em oposição à alta cultura, seus requintes e pretendida erudição. Entre elas, a fotografia, o cinema, e outras categorias ligadas à indústria cultural.

No entanto, nas últimas décadas, muitos artistas contemporâneos têm incorporado aos seus recursos expressivos advindos dessas práticas, dentre os quais, referenciais da tecelagem, colagens de rendas, roupas de família, crochê, tricô, macramê, bordado. E é imbuído desse espírito que o projeto Práticas artesanais e experiências estéticas contemporâneas abre-se à pesquisa poética, buscando articular relações entre práticas artesanais e abordagens contemporâneas da arte, experimentando orientações da estética relacional, segundo a qual a experiência estética não está no objeto em si, mas nas relações entre as pessoas.

Nessa direção, a primeira proposta de trabalho de pesquisa em arte é a instalação relacional NÓS & NÓS (fevereiro a março/2013), cujo projeto de montagem foi aceito pela Galeria da FAV, e que prevê o estabelecimento de links entre práticas artesanais, tais como tecelagem e bordado, e arte contemporânea, orientado pela estética relacional.

Intervençao artística Tramas à beira do caminho

Fotos: Alice Fátima Martins

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Exposição Nós&Nós

Alice Fátima Martins, Cleomar Rocha e Quéfren Crilanovick

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Texto Arte relacional em uma poética colaborativa: NÓS & NÓS disponível em: <http://www.academia.edu/5058122/ARTE_RELACIONAL_EM_UMA_PO%C3%89TICA_COLABORATIVA_N%C3%93S_and_N%C3%93S&gt;

BASES TEÓRICAS

O referencial teórico apoia-se nas discussões da cultura visual situada no campo dos Estudos Visuais, orientado pelo esforço para ampliar as discussões sobre a experiência estética do ambiente das artes visuais e suas visualidades numa gama mais complexa de visualidades produzidas em âmbitos e circuitos nem sempre legitimados pelos sistemas da arte, ou pelos lugares consagrados ao trabalho artístico assim reconhecido, mas que, indubitavelmente, são portadoras e propiciadoras de experiência estética.

Nesses termos, as discussões propostas evocam o pensamento de autores tais como:

  1. Nicola Bourriaud: estética relacional na arte contemporânea;
  2. Jacques Rancière: relações entre ensinar e aprender, bem como sobre a produção de visualidades nos cenários urbanos contemporâneos, e as narrativas do cinema;
  3. Jose Luis Brea: regimes de visualidades, tendo como pauta as relações entre imagens da arte e outras visualidades no cenário contemporâneo, e a cultura visual;
  4. Robert Stam e Ella Shohat: contranarrativas formuladas como espaços de resistência em relação a narrativas e imagens hegemônicas, no campo das artes visuais e do cinema;
  5. Vilém Flusser: imagens técnicas e cultura contemporânea.

As reflexões decorrentes de todos os projetos são orientadas por questões tais como: como se dão a produção e circulação de experiências estéticas visuais fora do sistema da arte, legitimado institucionalmente? Quem chancela algumas práticas culturais, reconhecendo-as como artísticas, em detrimento de uma extensa lista de outras experiências, desqualificadas? Que experiências artísticas ou estéticas são veiculadas nos ambientes educativos? No contexto não formal de educação, como se aprendem a produzir filmes, vídeos, fotografias, e outros fazeres e narrativas visuais? Essas aprendizagens pautam-se por quais orientações estéticas, epistemológicas, artísticas?

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